O poder do dinheiro nas campanhas eleitorais – 5 perguntas para Jonathan Phillips e Natália Bueno

CEPESP  |  27 de maio de 2019
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No dia 13 de maio foi divulgado o relatório final do estudo “O poder do dinheiro nas campanhas eleitorais”, que analisa o quão influente é o dinheiro dentro do jogo político e como as mudanças na legislação sobre essa área impactaram as eleições de 2018.

Uma das pesquisas do estudo utilizou dados colhidos pela Operação Lava Jato para tentar determinar como o dinheiro de origem ilícita influencia e chega às campanhas eleitorais. No processo, também foi criado um novo dataset com esses dados.

O pesquisador do Cepesp/FGV, Jonathan Phillips, apresentando os resultados de sua pesquisa. Foto: UmBrasil

Quais foram os resultados encontrados na análise e o que é esse dataset? Confira na entrevista com os pesquisadores do Cepesp/FGV, Jonathan Phillips e Natália Bueno.

5 perguntas – Jonathan Philips e Natália Bueno

1- Quão importante será o dataset que foi criado ao longo da pesquisa?

Até onde sabemos, esse é o primeiro banco de dados com dados sistemáticos e desagregados sobre a Lava Jato, pois as estimativas públicas, até o momento, são agregadas e utilizam critérios, até onde sabemos, pouco transparentes. Além disso, a maior parte dos bancos de dados sobre corrupção eleitoral no mundo são construídos baseados em avaliações de especialistas e documentos vazados de escândalos de corrupção. São duas fontes úteis, mas bem menos conservadores e baseadas em evidências, na nossa opinião, do que as usadas por nós. Até agora, nosso trabalho foi de mapear e codificar. O trabalho para nós e outros pesquisadores é: a partir dessas informações, temos como explicar o fenômeno da corrupção eleitoral e doações ilícitas?

2- Quais foram as dificuldades encontradas na análise dos  documentos da Operação Lava-Jato?

Há dois grandes tipos de dificuldades: um advém dos documentos e outra do próprio estudo de atividades ilegais. Sobre os documentos, as sentenças da Lava Jato não são padronizados (no sentido de gerar uma “base de dados”). Há um certo espaço para interpretação do que é utilizado para fins eleitorais, fins privados não-eleitorais, lavagem de dinheiro e propina. Muitas transações ilícitas se repetem nos documentos, o que exige muito cuidado para evitar uma contagem dupla das transações. Ou seja, tivemos que tomar muito cuidado para criar uma guia de codificação comum aos assistentes de pesquisa e tivemos duas codificações independentes para poder lidar com as possíveis interpretações dos documentos. Mas esses desafios são todos contornáveis, a princípio.

A segunda dificuldade é mais complicada e intrínseca ao estudo de corrupção eleitoral e atividades ilegais: os atores envolvidos têm incentivos para esconder seu comportamento ilícito. O que é revelado por investigadores e juízes não é necessariamente representativo de como essa atividade se desenvolve, de modo que temos somente uma luz pequena e provavelmente enviesada desse mundo “escondido” de doações ilícitas.

3- Quais as principais conclusões do estudo dessa área?

O estudo estimou a quantidade de recursos desviados através das atividades ilegais documentadas na Lava Jato para financiamento de campanhas eleitorais. Baseado nas sentenças da Lava Jato, estimamos uma amplitude entre R$194 milhões a R$965 milhões que foram usados para fins eleitorais. Dado que as sentenças muito provavelmente não possuem todas as transações ilícitas no período, tentamos também extrapolar para gerar uma estimativa sob a suposição de que as regras de corrupção mais sistemáticas na Petrobrás foram aplicadas consistentemente para todos os contratos entre 2002 e 2014, incluindo aqueles que não foram alvos da Lava Jato. Essa estimativa é mais especulativo, mas sugere que o valor de financiamento eleitoral ilícito pode chegar a R$ 7.4 bilhões.

4- Como o fluxo ilegal de dinheiro encontrado pela Lava-Jato influenciou o financiamento de campanhas eleitorais?

A nossa análise sugere que o valor ilícito de financiamento eleitoral entre 2002 e 2014 foi entre 6% e 46% do financiamento eleitoral legal. Então recursos ilícitos aumentaram o custo de campanhas eleitorais, mas permanece incerto o impacto substantivo dos recursos envolvidos. Nossos resultados não são desagregados por partidos, mas há evidências de que o financiamento ilegal nos documentos da Lava Jato foi concentrado entre os membros da coalizão federal. A Lava Jato também revelou uma relação complicada e muitas vezes escondida entre financiamento ilegal e legal: encontramos R$ 5.8 milhões de desvios ilegais citados na Lava Jato que foram doados oficialmente e documentados pelo TSE, sugerindo que finanças legais e ilegais são misturadas. De R$ 15.4 bilhões de financiamento lícito entre 2002 e 2014, R$ 1.08 bilhões (7%) foi doado por empresas citadas na Lava Jato. Não podemos avaliar qual proporção destes recursos foram ilícitos, mas a evidência sugere que empresas citadas na Lava Jato tendem a doar mais para partidos do que candidatos, e distribuir doações entre uma maior quantidade de candidatos.

5- É possível dizer se as mudanças nas leis de financiamento de campanha eleitoral para as eleições de 2018 mudaram o panorama encontrado por vocês? Como?

Infelizmente, não temos como saber. Além do mais, não analisamos os dados de 2018. Mas pelo fato de não haverem contribuições legais de empresas em 2018, parte da nossa análise não é possível em 2018 pois elas focam em pessoas jurídicas. Até 2014, havia um número muito pequeno  de pessoas físicas envolvidas na Lava Jato com contribuições oficiais ao TSE (mas não sabemos como isso aconteceu em 2018).

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