No Brasil, quase um em cada quatro brasileiros receberam o auxílio emergencial de R$ 600. Embora fundamental para garantir uma renda e um consumo mínimo de bens essenciais (como alimentos e artigos de higiene pessoal e da casa), o auxílio também pode ter agido para reduzir o isolamento social dos beneficiários, segundo dados de pesquisa conduzida pela Universidade de Oxford-USP e FGV. De acordo com a pesquisa (que ouviu 1654 moradores de oito capitais brasileiras por telefone), “aqueles que receberam o auxílio saíram mais de casa para ir ao banco e para fazer compras de comida e produtos essenciais, enquanto os que não receberam deixaram suas casas para outras atividades, com destaque para as esportivas e, em menor extensão, para trabalhar”. Os resultados estão apresentados na nota técnica 15, da Rede de Pesquisa Solidária formada por mais de 70 pesquisadores de diferentes centros de pesquisa para estudar os efeitos da pandemia da Covid-19.
Para os pesquisadores, a não redução da mobilidade dos que receberam o auxílio reforça a percepção de que a ausência de uma estratégia integrada do setor público enfraqueceu a efetividade das medidas contra a pandemia. Faltou, por exemplo, uma campanha mais eficiente de informação capaz de alertar a população acerca da importância de reduzir a mobilidade ao mínimo necessário. “Sem essa atuação complementar, cuja responsabilidade primeira é do setor público, o programa pode contribuir para a quebra do distanciamento físico e mostrar-se ineficaz na diminuição do contágio pelo vírus”, alertam os pesquisadores.
Entre os 1654 entrevistados, os pesquisadores separaram uma amostra de 680, que contempla apenas os elegíveis ao auxílio. Destes, 564 receberam o benefício e 116, não. Considerando estes dois grupos, os que receberam o benefício saíram de casa 3,51 vezes nas duas semanas que antecederam à entrevista, e os que não receberam, saíram de casa 3,41 vezes. A pesquisa foi realizada por telefone entre os dias 6 e 27 de maio. A amostra foi aleatória e estratificada por idade, sexo, renda e nível de escolaridade. Foram entrevistados 200 moradores de 7 capitais, Fortaleza, Goiânia, Manaus, Rio de Janeiro, Recife, Salvador e Porto Alegre, e outros 250 em São Paulo.
Se o número de vezes que cada grupo saiu de casa foi semelhante, as razões foram diversas. Entre os que receberam o auxílio, as saídas estiveram relacionadas ao consumo; entre os que não receberam, atividades esportivas e trabalho foram os principais motivos relatados pelos entrevistados. “Esses dados sugerem que o auxílio emergencial poderia ter contribuído efetivamente para o distanciamento social se estivesse integrado a outras medidas, a exemplo de uma forma de pagamento mais adequada para se evitar idas ao banco, ou medidas voltadas para desencorajar as saídas para aquisição de bens essenciais”, apontam os pesquisadores.
A equipe responsável por esta nota técnica teve coordenação de Lorena Barberia (professora do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo e pesquisadora do Cepesp), Jose Eduardo Krieger (Incor-FMUSP), Marco Antonio Gutiérrez (Incor-FMUSP) e Kelly Senters Piazza (DFPS – United States Air Force Academy), e contou com os pesquisadores Wedgide Bourdeau (United States Air Force Academy), Ingrid Castro Silva (USP) e Maria Letícia Claro de F. Oliveira (US e CEPESP/FGV).
Além da nota técnica 15, outros trabalhos da Rede podem ser encontrados aqui; e mais detalhes sobre a pesquisa feita pelos pesquisadores de Oxford, da USP e da FGV, aqui.