A explosão de candidaturas coletivas e suas chances eleitorais

CEPESP  |  3 de novembro de 2020
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Por Guilherme Russo*

Uma nova forma de tentar renovar e oxigenar a política é o lançamento de candidaturas coletivasAinda que não sejam previstas por lei, houve uma explosão no número destas candidaturas. Usando o nome escolhido para ir às urnas (nome de urna), localizei 257 candidaturas que indicam ser de movimentos coletivos em comparação a 13 em 2016 e 3 em 2012.

Essa classificação de candidatura coletiva foi feita da seguinte forma: se a candidatura tem no seu nome de urna pelo menos uma das palavras: “bancada”, “coletiva”, “coletivo”, “mandata” ou “mandato”- é classificada como candidatura coletiva. É importante notar que pode haver candidaturas coletivas que não usaram essas palavras (falso negativo), como foi o caso da candidatura a vereadora da hoje deputada federal e candidata a prefeita Áurea Carolina em Belo Horizonte. Da mesma forma, podem existir candidaturas classificadas como coletiva, mas que não são apesar de usar uma dessas palavras (falso positivo). Por exemplo, “Zé do Coletivo” pode se referir ao coletivo como meio de transporte, não no sentido de um coletivo político.

Se analisarmos o uso de cada uma dessas palavras individualmente, temos que todas as 13 candidaturas de 2016 classificadas como coletivas eram baseadas na palavra “coletivo”. Em compensação, 149 das 257 candidaturas classificadas usam essa palavra em 2020, enquanto 108 não usam. As palavras “mandato” e “bancada” são usadas por 57 candidaturas, e as palavras “coletiva” e “mandata” por 40 e 10, respectivamente. Vale notar também que muitas candidaturas usam mais de uma dessas palavras, como “Mandato Coletivo” ou “Bancada Coletiva”, por isso a soma não é de 257 na figura abaixo.

Um aspecto importante dessas candidaturas coletivas é que elas são, de forma geral, ligadas a partidos de esquerda ou centro-esquerda. Especificamente, dentre essas 257 candidaturas, 99 são do PSOL, 51 do PT, 23 do PC do B, 11 do PDT, 9 do PSB, 8 da REDE e 8 do PV.

Mas mesmo dentro dos partidos, há uma concentração muito grande dessas candidaturas no estado de São Paulo. Das 99 candidaturas coletivas do PSOL, 46 estão no estado de São Paulo, 9 no Pará, 8 no Rio de Janeiro, 7 em Pernambuco e apenas 2 em Minas Gerais. Já no PT, 22 das 51 candidaturas estão em São Paulo, seguidas por 6 em Santa Catarina e no Paraná. Só na cidade de São Paulo, são 8 candidaturas coletivas do PSOL e 2 do PT. O PSOL também tem mais de duas candidaturas coletivas em Belém, Águas Lindas de Goiás (GO), Cotia (SP) e Taboão da Serra (SP). Já o PT tem mais de 2 candidaturas coletivas em Bertioga (SP) e Florianópolis (SC).

Mas por que dessa explosão entre os partidos de esquerda em 2020, principalmente do PSOL e em SP? Para além das razões da inclusão de diferentes pensamentos, pessoas e pautas, uma das razões parece ser o sucesso de uma candidatura coletiva em 2018.

Usando a mesma codificação para as candidaturas à câmara federal e à assembleia estadual em 2018, encontrei apenas 9 casos que utilizaram algumas das palavras listadas acima no nome de urna, sendo que 6 foram do PSOL no estado de São Paulo. Entretanto, uma dessas candidaturas, a Bancada Ativista, registrada em nome da hoje deputada estadual Mônica Seixas, foi eleita à uma cadeira na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP).

E é interessante notar que quase metade dessas candidaturas estão registradas no nome de mulheres, em comparação a aproximadamente 34% de candidaturas de mulheres no total. Isto é, mesmo sendo uma candidatura coletiva na qual exista um acordo informal entre diferentes pessoas que participam do coletivo, legalmente é preciso nomear alguém como responsável pela candidatura.

Das 257 candidaturas coletivas de 2020, 80 são registradas no nome de mulheres auto-identificadas como brancas, 25 por mulheres pretas, 15 por mulheres pardas, 1 por mulher amarela e uma sem identificação de cor de pele. Já em 2016, nenhuma das 13 candidaturas classificadas aqui como coletiva eram de candidatas mulheres.

Mas apesar do grande aumento no número dessas candidaturas, quais são as chances delas serem eleitas?

As eleições aos cargos legislativos são especialmente difíceis de prever dado o número de candidaturas e a falta de pesquisas. Porém, é importante lembrar que o número de vagas nas câmaras municipais da grande maioria dos municípios é pequeno, o que exige que os partidos dessas candidaturas tenham um percentual grande de votos válidos. Por exemplo, em uma cidade com 11 vagas a vereadora (municípios com entre 15.001 e 30.000 habitantes), um partido garante ao menos um assento com mais de 9.1% dos votos (100/11).

Já a eleição para deputada estadual em São Paulo, na qual a candidatura da “Bancada Ativista” foi bem-sucedida em 2018, é a corrida com mais vagas em disputa, são 94 cadeiras. Logo, um partido garante uma vaga com 1.07% dos votos válidos. Em 2018, o PSOL conseguiu 4.3% dos votos válidos na corrida à deputada estadual em São Paulo e ganhou 4 cadeiras.

Se usarmos esse corte baseado no número de vagas e a votação do PSOL em 2016 como referência em cada um dos municípios onde há pelo menos uma candidatura coletiva, a perspectiva não é muito boa nas cidades menores, pois além do partido ter que passar o corte, o que não fez em 2016, a candidatura há de ficar bem posicionada no ordenamento por votos dentro da lista. Os pontos azuis escuros na figura abaixo mostram os municípios onde o PSOL teve votação em 2016 acima do percentual de votos que garantia ao menos uma vaga.

Já o PT teve, de forma geral, desempenho melhor e votação acima da barreira mesmo em algumas cidades menores, o que pode ser visto como maior esperança para essas candidaturas, ainda que ser eleita sempre depende de estar no topo da lista de votos dentro do partido.

Por outro lado, há uma série de motivos para acreditarmos que os resultados de 2020 serão diferentes dos resultados de 2016. Além das inúmeras mudanças na política e na atenção dos eleitores às causas que muitas das candidaturas de esquerda se dedicam, as mudanças nas eleições proporcionais que começam a valer esse ano podem ajudar o PSOL e o PT nessas cidades menores onde os dados indicam que não teriam votação suficiente para alcançar o quociente.

Primeiro, o fim das coligações nas eleições proporcionais pode implicar em maior dispersão de votos entre os partidos nas cidades de porte médio e grandes, o que tende a reduzir o quociente eleitoral verdadeiro. E, talvez mais importante, a regra de alocação das cadeiras que sobram depois da divisão segundo o quociente partidário também mudou. Anteriormente, somente concorreriam à distribuição das vagas remanescentes os partidos (ou as coligações) que tiveram quociente partidário maior ou igual a um, mas a partir desse ano, os partidos que não obtiveram essa votação também podem concorrer às vagas não preenchidas pelo cálculo do quociente partidário. Assim, mesmo que o partido não tenha votação acima do quociente, é possível que os partidos consigam uma vaga e, sendo a candidatura mais votada dessa lista, a candidatura coletiva seja eleita.

*Guilherme Russo é pesquisador do Cepesp

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