Professores e especialistas em processo constitucional celebraram 30 anos da Constituição Federal de 1988, com debates sobre o contexto da sua implementação e transformações que vieram após sua aprovação.
A discussão ocorreu num seminário realizado nos dias 16 e 17 pelo Centro de Política e Economia do Setor Público (Cepesp), curso de graduação em Administração Pública e Governo, Metrado Profissional em Gestão e Política Pública e Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
As mudanças que vieram depois de 1988 deram numa Constituição 44% maior do que a original. “Isso a torna a segunda maior Constituição do mundo, perdendo apenas para a da Índia”, destacou o professor da Universidade de São Paulo (USP), Rogério Arantes.
A quantidade de políticas públicas e sociais previstas no texto constitucional é um dos motivos apontados pelos especialistas para o número grande de emendas na carta constitucional brasileira.
O professor da FGV, Oscar Vilhena, explicou que a “generosidade” da Constituição acontece desde sua formulação, em razão da ambição por direitos que os diferentes setores da época expressavam: “Falava-se que essa primeira etapa serviu como um verdadeiro pacto social, em que toda a sociedade que estava minimamente articulada esteve lá para tentar entrincheirar direitos e interesses”.
- Da esquerda para a direita, Fernando Limongi, Marta Arretche, George Avelino (mediador), Luiz Felipe de Alencastro e Floriano de Azevedo Marques, palestrantes da tarde do dia 16
Marta Farah, também professora da FGV, reafirma o ponto de Vilhena e lembra que a extensa carta de direitos da Constituição de 88 permitiu o avanço na universalização dos principais serviços públicos: “A Constituição rompe com o caráter corporativista que o acesso a direitos tinha no Brasil. Quem tinha direitos antes da Constituição de 88 era apenas o trabalhador organizado em categorias reconhecidas pelo Estado”.
Ainda sobre os direitos previstos na Constituição, a professora Farah acredita que o Brasil vinha seguindo uma trajetória positiva em relação a avanços sociais, mas atenta para uma recente e contínua perda de direitos. Lembra das reformas Trabalhista e da Previdência e apresenta dados atuais de desemprego, aumento da taxa de mortalidade infantil e da extrema pobreza.
“Nós temos o que comemorar? Hoje, não. Nós tínhamos, até recentemente, não de forma eufórica, mas tínhamos o que comemorar, sobretudo o esforço de construção institucional de novas práticas”.
Outros especialistas, como os professores Fernando Abrucio (FGV) e Vanessa Elias (UFABC), apontaram grandes avanços nos sistemas públicos de saúde e educação, apesar da constante necessidade de aprimoramentos. Sobre a educação, Abrucio verifica que, apesar de a democracia brasileira ser jovem, produziu avanços “extraordinários, quase mágicos”.
Apesar do entendimento geral dos palestrantes ter sido de avanços significativos após a Constituinte, Luiz Felipe de Alencastro e Floriano de Azevedo, respectivamente, professores da FGV e da USP, também expressaram visões críticas aos desdobramentos da Constituição. Contaram os bastidores político da formulação do texto no fim dos anos 1980 e as divisões institucionais e de poderes que prejudicam o constitucionalismo.
Para Alencastro, obstáculos como a transformação do vice presidencialismo em uma potencial maneira de conspiração contra o presidente e leis ineficientes e obsoletas da Carta impedem a existência de um aparelho governamental estável: “Quem assumir a presidência do ano que vem, já está na mira do Congresso com ameaça de impeachment”.
Já Azevedo se considera cético e destaca quatro deficiências constitucionais que resultaram em uma ordem “disfuncional”: estrutura federativa irracional, instituições que engrandecem e não cabem em si, pouca definição de competências e diálogo entre os poderes e um estado individualista que está mais a serviço dele próprio do que do cidadão. “É uma estrutura fadada a dar errado”.
- Palestrantes da manhã do dia 17. Da esquerda para a direita, Fabiana Luci de Oliveira, Humberto Dantas (mediador), Eloísa Machado e Rogério Arantes
Palestrantes do evento
No dia 16, as palestras ficaram por conta de: Brasílio Salum Júnior (USP), Pedro Dallari (USP), Marcus Melo (UFPE), Danilo Medeiros (Virginia University), Floriano de Azevedo Marques (USP), Marta Arretche (USP), Fernando Limongi e Luiz Felipe de Alencastro (FGV). As mediações dos debates foram feitas por Lara Mesquita e George Avelino, ambos pesquisadores do Cepesp.
No dia 17, os convidados para o debate foram: Conrado Ubner Mendes (USP), Rogério Arantes (USP); Fabiana Luci de Oliveira (UFSCar/CNJ); Eloísa Machado (FGV), Vanessa Elias (UFABC), Fernando Abrucio, Marta Farah e Oscar Vilhena, todos da FGV. Os palestrantes foram mediados por Humberto Dantas, da Escola do Parlamento, e Cláudio Couto, pesquisador do Cepesp.
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Beatriz Caroline Trevisan, estudante de jornalismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie e pesquisadora assistente do Cepesp.