Chegamos enfim ao segundo turno. Como ocorreu nas quatro últimas eleições, o Brasil se dividiu novamente entre vermelhos e azuis, mas agora com uma novidade no campo azul: no lugar costumeiro do PSDB, vemos emergir a candidatura de extrema-direita de Jair Bolsonaro.
Mais do que isso, Bolsonaro conseguiu a proeza que o PSDB não conseguiu nos pleitos recentes: estar à frente do PT no primeiro turno.
É lugar comum na política dizer que “segundo turno é uma nova eleição”. Porém, os resultados de eleições presidenciais do passado não confirmam essa tese. No segundo turno, nunca se observou uma mudança em relação ao vencedor do primeiro turno, o que joga certo favoritismo para a candidatura de Bolsonaro.
Pode ser diferente desta vez? O que pesa a favor ou contra a manutenção dos 100% de sucesso do vencedor do primeiro turno?
Obviamente, contamos apenas com cinco casos de eleição presidencial que chegaram a ter segundo turno antes desta (1989, 2002, 2006, 2010, 2014), o que é muito pouco para se fazer inferências estatísticas. Para aumentar o escopo de análise e buscar responder essa questão, coletou-se no CepespData os dados de todos os segundos turnos ocorridos no Brasil desde 1998, tanto para presidente quanto para governador e prefeitos.
Nesse sentido, obteve-se no total 272 eleições em dois turnos em quase 20 anos de eleições. Constata-se que, em 72% dos casos, quem chegou em primeiro lugar no primeiro turno levou a melhor no segundo. O dado em si revela que há de fato um favoritismo de quem termina o primeiro turno em primeiro lugar, mas que pode ser maior ou menor a depender de dois fatores:
1) o percentual de votos que o primeiro colocado amealhou na primeira etapa.
2) a diferença em relação ao segundo colocado.

Para avaliar esses dois pontos, recortamos as eleições com os parâmetros numéricos semelhantes aos obtidos por Bolsonaro. Ele chega nesse segundo turno com 46% dos válidos conquistados e 17 pontos percentuais (pp) sobre o segundo colocado.
Seguindo esse recorte, observa-se que, candidatos que chegaram em primeiro lugar com mais de 45% dos votos válidos no primeiro turno, conseguiram se reeleger em 88% dos casos. Além disso, se chegaram com mais 15 pp sobre o segundo colocado, esse índice sobe para 95%, enquanto que para aqueles que chegaram com menos de 15 pp, a taxa de eleição foi de 79%.
Por outro lado, quem chegou com menos de 45% dos votos válidos no primeiro turno, em 66% dos casos se elegeu, e esse percentual passa para 70% se chegaram com mais de 15 pp sobre o segundo colocado, e cai para 63% se ele foi abaixo de 15 pp.
Esses dados revelam que Bolsonaro é amplamente favorito a vencer a disputa se levarmos em consideração esses padrões estatísticos sobre as eleições passadas. Ele se encaixa na categoria dos 95% de candidatos que obtiveram sucesso: foram 39 vitórias em 41 eleições onde o candidato chegou acima de 45% dos válidos e 15 pp ou mais de vantagem sobre o segundo colocado ao final do primeiro turno.
Ademais, e à guisa de curiosidade (e provocação), esses dados revelam também que nossos “hermanos” argentinos têm certa razão nas regras de segundo turno que regem suas eleições.
Na Argentina, bastam 45%+1 dos votos válidos (não 50%+1) para vencer no primeiro turno. Entretanto, o candidato mais votado evita o segundo turno se obtiver entre 40 e 45% e tiver mais de 10 pontos percentuais sobre o segundo colocado.
Tendo em vista que viradas são pouco comuns com esse patamar de voto, de fato parece ser uma perda de tempo e de recursos termos um segundo turno quando são atingidos esses patamares eleitorais.
Em tempos bicudos, em que o erário é o grande responsável pelos recursos de campanha, não seria totalmente descabido pensarmos em modelo semelhante para o Brasil.
Texto originalmente publicado no site Valor Econômico.
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Jairo Pimentel Jr. é cientista político e pesquisador do Centro de Política e Economia do Setor Público (Cepesp/FGV).
Este artigo é de responsabilidade do Centro de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getúlio Vargas (Cepesp/FGV) faz parte da parceria “Eleição em Dados”, será publicado terça-feira em versão digital no Valor Pro e na quarta-feira em versão impressa pelo Valor Econômico.