O exemplo da Siemens

CEPESP  |  8 de agosto de 2013
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Artigo de Sérgio Praça publicado na edição de agosto da revista Época Negócios.

Em junho de 2002, a empresa alemã Siemens venceu licitação do governo de São Paulo para a manutenção de trens da CPTM (Companhia Paulista de Transportes Metropolitanos). Em seguida, a Siemens contratou uma outra empresa, a MGE Transportes, a quem pagou R$ 2,8 milhões até junho de 2006. Ao menos R$ 2,1 milhões dessa quantia foram parar nos bolsos de políticos do PSDB e diretores da CPTM, segundo denúncia da própria Siemens ao Ministério Público paulista e ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), órgão do governo federal.

Os funcionários da Siemens envolvidos no esquema de corrupção – a transcrição descrita acima é apenas uma parte – só puderam falar porque há, desde novembro de 2011, uma lei que permite a cooperação de empresas envolvidas em atos corruptos em troca de imunidade. É a Lei 12.529/2011, apelidada de “Lei do SuperCade”, que teve como principal objeto o fortalecimento organizacional do Conselho Administrativo de Defesa Econômica.
Há duas coisas a notar neste caso. A primeira é que a ideia de que empresas corruptoras são menos punidas do que políticos corrompidos não é bem verdade. Desde a criação do Cadastro de Empresas Inidôneas, em 2010, empresas que foram sancionadas por atos corruptos em qualquer esfera governamental são impedidas de participar de licitações. (É o caso recente da Técnica Construções, a nova firma do grupo Delta.)
É fato, no entanto, que os mecanismos legais para que uma empresa que pagou propina denuncie o ato corrupto eram, até a Lei 12.529, bastante fracos. A opção era convencer um promotor do Ministério Público de que a empresa forneceria informações suficientes para justificar a imunidade. Mas isso ficaria sujeito à interpretação do promotor. Daí a importância desta lei e da atuação do CADE.
A segunda lição é como a responsabilização de corruptos e corruptores, no Brasil, depende de um emaranhado de instituições, que cooperam e competem entre si. Entrevistei, ano passado, em caráter sigiloso, um funcionário do Tribunal de Contas da União que me contou coisas ótimas (como os acordos com tribunais de contas estaduais e o avanço no combate à lavagem de dinheiro) e coisas péssimas (como a guerra por relevância entre Polícia Federal e Ministério Público – isso antes da polêmica sobre a PEC 37, proposta de emenda constitucional que tirava poderes de investigação do MP e foi derrubada na Câmara dos Deputados).
A consequência mais importante do caso Siemens é que, agora, temos mais uma agência governamental que pode atuar no combate à corrupção: o Cade. O tempo dirá se isto é bom (por mobilizar mais recursos) ou ruim (por dispersar esforços e exigir intensa cooperação, difícil de coordenar, com outras agências).

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