Pandemia não está controlada e Brasil ainda pode melhorar combate à Covid-19, avaliam pesquisadores

CEPESP  |  23 de setembro de 2020
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A pandemia da Covid-19 começa a dar os primeiros sinais de redução no ritmo de contaminação no Brasil, mas é muito cedo para considerar que a propagação da doença está controlada. “Ainda há tempo para melhorar a resposta do país à pandemia”, disse a professora da USP e pesquisadora do Cepesp, Lorena Barberia, em debate organizado pelo “Ciência USP”. Barberia insistiu que é importante entender que o Brasil chegou a mais de 130 mil mortes e mais de 4,5 milhões de pessoas infectadas por causa das políticas adotadas (e das não adotadas) e das respostas que a sociedade deu (ou deixou de dar) a essas políticas. “Práticas básicas poderiam ter salvado muitas vidas”, argumentou, lembrando que o país instituiu o auxílio emergencial, mas obrigou as pessoas a fazer fila na porta do banco para acessar e receber o benefício.

O debate reuniu, além de Barberia, Ester Sabino, professora da Faculdade de Medicina da USP, e Onício Leal Neto, pesquisador da Universidade de Zurique e fundador da startup Epitrack, e foi mediado pela jornalista Luiza Caires. Durante os debates, os pesquisadores destacaram que a pandemia da Covid-19 trouxe uma mobilização da ciência e uniu pesquisadores de diferentes áreas em uma experiência quase inédita e que deveria ser repetida, seja para outros desafios na área de saúde (especialmente de atenção básica), seja como base de uma nova atuação da universidade. Barberia e Sabino estão desenhando um curso de pós-graduação na USP que vai integrar várias áreas, replicando a visão de conhecimento compartilhado que marca várias iniciativas de pesquisa em torno da Covid-19.

Barberia, no destaque; Solano, Caires e Leal Neto, a partir do alto: ciência em pauta

Sabino  comentou a notícia divulgando uma pesquisa recente do Imperial College afirmando que o “RT” do Brasil chegou a 1, e explicou que quando esse índice fica abaixo de 1, significa que a epidemia está aos poucos diminuindo, porque cada pessoa contaminada transmite o vírus para menos de uma pessoa, criando uma cadeia de declínio da transmissão. “Mas como qualquer índice, este também tem um intervalo de confiança, que é de 0,86 a 1,21. Então ele ainda pode estar acima de 1″, disse. Além disso, Sabino lembrou que este indicador está sendo declarado para o Brasil inteiro, mas temos regiões aumentando e outras diminuindo no país. Por isso é preciso olhar notícias como essas com cuidado. Mas é sim uma boa notícia”, argumentou.

Barberia ponderou que se o Brasil tivesse feito um isolamento social mais efetivo no começo, a pandemia poderia estar muito mais controlada atualmente. O país está vivendo há seis meses com altas taxas de contaminação da doença e boas políticas públicas poderiam ter garantido uma trajetória menos nociva para a pandemia. Ela contou do trabalho de mapeamento das medidas de distanciamento social (em um primeira etapa) e das regras de flexibilização (segunda etapa) que está sendo feito pela Rede de Pesquisa Solidária, experiência de integração de cientistas de diferentes áreas, universidades e centros de pesquisa, que reúne mais de 70 pesquisadores, da qual ela é coordenadora científica. A rede também tem se dedicado aos diferentes indicadores (e suas lacunas) de mapeamento da doença e também aos efeitos sociais, econômicos e fiscais da pandemia. Ela contou que o trabalho mostrou que cada Estado está usando critérios diferentes para a flexibilização, que desde o começo (e também agora) não existiu uma coordenação e uma uniformidade de medidas, e que faltou (e ainda falta) transparência nos dados. Ela usou como exemplo a ocupação de leitos de UTI, onde os Estados divulgam um índice total, mas não fornecem os dados que permitam identificar se a falta é maior ou menor nos hospitais públicos e qual a distribuição sócio-regional desta ocupação.

Onício Leal relatou o trabalho desenvolvido através da Epitrak, que tem como fundamento a lógica de vigilância participativa. A ideia é que o próprio cidadão forneça dados que ajudem a mapear a propagação territorial da doença e assim contribua para o seu combate. Há experiências em cerca de 1,1 mil municípios do país, contou, destacando as experiências de Caruaru, interior de Pernambuco, e Teresina, capital do Piauí, onde a vigilância cidadã foi incorporada como uma ferramenta da vigilância tradicional, trazendo bons resultados para o trabalho da saúde pública.

A íntegra do debate está disponível aqui, e você acessa os trabalhos da Rede de Pesquisa Solidária, que tem apoio do Cepesp, aqui.

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