A pandemia da Covid-19, e as incertezas que ela trouxe para a população, pode fazer com que as eleições municipais deste ano sejam marcadas por um voto mais “conservador”, um voto em políticos já conhecidos pelo eleitor, reduzindo a procura pelo “novo” que marcou as eleições de 2018. Esse foi um dos pontos discutidos na live semanal de conjuntura organizada pela Quaest Consultoria, com participação dos pesquisadores do Centro de Política e Economia do Setor Público (FGV CEPESP), Jairo Pimentel e Guilherme Russo, além de Juliana Leitão, especialista em políticas educacionais da Fundação Roberto Marinho, e Felipe Nunes, da Quaest e UFMG.

Pimentel e Nunes relataram que em pesquisas qualitativas com eleitores têm aparecido esse sentimento do eleitor. “Em muitos grupos focais, vemos que a discussão do ‘eu quero o novo’, se não acabou, diminuiu”, contou Pimentel, ressaltando que há um sentimento de resgatar o passado, de voltar a um período de maior tranquilidade, onde existia emprego. “Isso pode levar o voto para os políticos mais conhecidos, experientes, que já entregaram resultados no passado”, explicou. Nunes ponderou que esse sentimento apareceu quando estava sendo discutido o impeachment do presidente Jair Bolsonaro já que as pesquisas indicavam que as pessoas eram contra justamente porque não queriam mais confusão.
Esse sentimento, associado às mudanças das regras eleitorais que vão favorecer a fragmentação partidária em 2020 (considerado um momento de transição para a menor fragmentação nos próximos anos), devem favorecer os atuais prefeitos candidatos à reeleição, acrescentou Russo. Essa combinação de cenário fragmentado e busca por políticos que “entregaram resultados no passado” tende a favorecer o ex-prefeito Eduardo Paes na disputa pela prefeitura carioca, avaliou Russo. Eduardo Paes foi prefeito do Rio de Janeiro por dois mandatos entre 2008 e 2016 e em Julho de 2014, era aprovado por 37% e outros 35% consideram sua gestão regular. Por outro lado, em dezembro do ano passado, apenas 7% aprovavam a gestão do atual prefeito Marcelo Crivella e outros 20% a consideravam regular.
Pimentel desenhou um cenário para a cidade de São Paulo com o atual prefeito, Bruno Covas (PSDB), e Celso Russomano (Republicanos) chegando ao segundo turno. Pimentel listou a favor de Covas o fato de ser o atual prefeito e a coligação que lhe dará 5 minutos na TV, um tempo superior ao que João Doria teve na disputa de 2016, quando foi eleito prefeito de São Paulo. Já Russomano tem a seu favor o eventual apoio do presidente Bolsonaro. Ainda que Bolsonaro não tenha feito uma declaração formal, Russomano disse que Bolsonaro tem carinho por ele. “Mesmo sem o apoio formal, se ele contar com as redes mais ligadas ao bolsonarismo e as redes evangélicas, será uma vantagem importante na disputa”, argumentou Pimentel.
E para esta aposta, de que Covas e Russomano estarão no segundo turno, contribui a avaliação da fragmentação da esquerda e da fraca candidatura de Jilmar Tatto (PT), que pode ser conhecido no seu reduto (zona sul da capital), mas não tem projeção em toda a cidade, ponderou Pimentel. “E o PT, além de enfraquecido, está dividido”, lembrou o pesquisador.
Guilherme Russo chamou atenção para a impressionante aprovação de Bolsonaro, que mesmo sendo menor quando comparada à de ex-presidentes no segundo ano de mandato, pode ser considerada alta diante das notícias das mortes provocadas pela pandemia, das queimadas, entre outras “atrocidades”. “Bolsonaro é quem pauta a política no Brasil, não é o PT mais. O que ele fala é o que condiciona as pessoas; é o que importa, é o que mobiliza, você goste ou não”, argumentou, acrescentando que uma incógnita é até onde vai essa popularidade, e como ela ficará em 2021, quando será necessário ajustar as contas públicas, o que significa menos espaço para programas como o auxílio emergencial, que ajudou o presidente este ano.
O outro assunto do debate foram os indicadores do Ideb, especialmente as notas do Ensino Médio. Juliana Leitão disse que chamou atenção dos pesquisadores o crescimento de 3,5 para 3,9 na nota média da rede pública no Ensino Médio (entre 2017 e 2019). Entre as “pistas” do que contribuiu para essa melhora (expressiva em termos do Ideb), Leitão disse que os Estados com melhores notas são aqueles que conseguiram colocar a educação como política de Estado e não de um governo. Ceará e Pernambuco, embora não sejam as notas mais altas, tem uma trajetória de melhora consistente ao longo dos anos e são Estados onde a educação tem sido prioridade. No caso de Pernambuco, o Ensino Médio em tempo integral foi aprovado como lei em 2008 e tem sido paulatinamente adotado em todo a rede estadual.
Pimentel e Russo ponderaram que o eleitor olha para a educação de uma forma mais “prática”: pensa menos na qualidade e mais na oferta e na infraestrutura. “Se o prefeito puder falar: acabou a fila de creche, é mais palpável, entrega mais”, observou Russo. “Os eleitores querem escola perto, com mais equipamento”, acrescentou Pimentel. Leitão, que trabalhou na Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro, ponderou que sua experiência mostra que as famílias podem não saber o que é o Ideb, mas sabem quais são as melhores escolas e tentam pôr seus filhos nelas. Por outro lado, os três concordam que esse não deve ser um grande assunto durante as eleições municipais deste ano, embora o debate sobre a volta ou não às aulas possa estar presente.
Você pode assistir essa discussão sobre a conjuntura aqui.