Recursos financeiros têm impacto em campanhas eleitorais

CEPESP  |  16 de maio de 2019
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Em evento ocorrido no dia 13 de maio de 2018 na FGV, foram divulgados os resultados da pesquisa “O poder do dinheiro nas campanhas eleitorais”, realizada pelo Cepesp/FGV e financiada pela Fundação BRAVA.

Na abertura, a vice-diretora da EESP-FGV, Lilian Furquim, destacou a relevância da pesquisa para a sociedade e meio acadêmico, destacando que “o Cepesp/FGV inaugurou a área de pesquisa em economia política [na EESP-FGV]”. Outro ponto levantado por Furquim foi a importância do fornecimento de dados para a discussão sobre financiamento de campanhas eleitorais.

Lilian Furquim (esq.), vice-diretora da EESP-FGV e Letícia Piccolotto (dir.), presidente executiva da Fundação BRAVA. Foto: UmBrasil

Letícia Piccolotto, presidente executiva da Fundação BRAVA, seguiu na mesma linha que Furquim, destacando a importância e impacto da pesquisa para a abertura de novas frentes de análise sobre o financiamento eleitoral e para o debate sobre o assunto, com a apresentação de diversos dados coletados.

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, comentou sobre as decisões recentes do STF que influenciaram o financiamento eleitoral. Destacou a inconstitucionalidade das doações por parte de empresas e a destinação de no mínimo 30% do fundo partidário a candidaturas femininas.

O ministro do STF Luís Roberto Barroso. Foto: UmBrasil

O ministro observou que o sistema eleitoral “funciona mal” e, portanto, deve mudar. Fez um mea-culpa ao lembrar que o STF errou ao proibir em 2005 a cláusula de barreiras e fidelidade partidária. Admitiu também o erro nas votações sobre a “portabilidade” dos recursos do fundo partidário e tempo de Rádio/TV, o que viabilizou a criação de inúmeros partidos depois de 2011, aumentando a fragmentação partidária.

Resultado: um cenário ingovernável de mais de 34 partido, em que, segundo suas palavras, alguns se transformaram em empresas, outros, numa “máfia”. Quanto ao sistema atual de voto proporcional em lista aberta, em que as vagas são divididas de acordo com a proporção de votos recebidos por cada partido, que define quem entra segundo a ordem dos mais votados, afirmou: “O eleitor não sabe quem elegeu e o político não sabe por quem foi eleito. Um não sabe quem tem que cobrar e o outro não tem para quem prestar contas”.

As discussões sobre o estudo foram iniciadas por George Avelino, coordenador do Cepesp/FGV e professor da EESP-FGV. Ele comentou que a pesquisa tinha o objetivo inicial de ver quanto custa uma eleição no país, e o quanto tomou maiores proporções.

George Avelino, coordenador do Cepesp/FGV. Foto: UmBrasil

O foco foi nos gastos de campanha para deputado federal, foco mais comum das propostas de reforma eleitoral e cuja distribuição entre as bancadas é a base para os cálculos da distribuição futura dos recursos públicos entre os partidos.

Realizando uma comparação entre as eleições de 2018 e 2014 foi possível observar uma queda nos gastos de campanha. Ao mesmo tempo, observou-se que “o financiamento é essencial para a eleição de um candidato”. Outra descoberta da pesquisa é que a eleição é um “jogo bem mais restrito que o imaginado”, com uma grande concentração na distribuição de votos.

Avelino ressaltou que, em 2018, a concentração de recursos foi menor, indicando que as modificações na legislação de financiamento de campanha tiveram efeitos. Ao mesmo tempo, a média de gastos, a diferença de gastos entre homens e mulheres e de candidatos brancos e pretos também apresentaram uma queda.

Conclusão: candidatos do sexo masculino, brancos e com alta escolaridade foram os mais afetados pelas mudanças no financiamento eleitoral, com uma queda de gastos em campanha. Isso ocorreu, pois eram esses candidatos que mais recebiam doações de empresas, agora proibidas.

Para o professor, a pesquisa foi muito importante não só pelos seus resultados, mas também porque “abriu um espaço de pesquisa” sobre o assunto, que deve ser preenchido por novos estudos.

Daniel Hidalgo, do MIT, considerou que, para ele, o resultado mais importante da pesquisa é que “a diferença entre eleitos e candidatos competitivos não eleitos foi pequena”, e ainda observou que a pesquisa analisou um período bem interessante para a área, a primeira eleição pós decisão do STF de proibir doações empresariais.

Daniel Hidalgo, do MIT. Foto: UmBrasil

Outro aspecto da pesquisa foi tentar determinar como a regulação afeta o financiamento eleitoral a partir de doações legais e ilegais. Jonathan Philips, pesquisador do Cepesp/FGV e professor da USP, comentou que os pesquisadores conseguiram desenvolver um dataset que “pode ser usado por pesquisadores no futuro”, composto pelas informações coletadas pela Operação Lava-Jato, antes desorganizados.

Uma das conclusões da análise desses dados foi que, a partir de 2010, as empresas citadas em delações doaram mais para partidos que para candidatos. Além disso, uma proporção substancial do financiamento de campanha não declarado possui uma origem ilegal.

Scott Desposato (esq.) da University of California San Diego, e Jonathan Philips (dir.), pesquisador do Cepesp/FGV. Foto: UmBrasil

Scott Desposato, da University of California San Diego, classificou a pesquisa como um “bom exemplo de como a academia pode contribuir para as políticas públicas”. Ele apontou que o estudo de campanhas sempre foi mais teórico, metafórico, e que os dados apresentados pelo Cepesp/FGV dão “luz” à questão.

O último aspecto da pesquisa foi a análise do financiamento político em perspectiva comparada. Lara Mesquita, pesquisadora do Cepesp/FGV, apontou que essa análise é importante para o debate sobre mudanças no modelo brasileiro, que hoje é misto (com doações privadas e fundos com dinheiro público).

De forma geral, os desafios globais na área são a profissionalização e elevação dos custos de campanha, desigualdade no acesso ao financiamento e abuso de recursos do Estado, com uma grande influência do dinheiro e baixo apoio da população (que doa poucos recursos para campanhas), além de uma falta de execução das regulações.

A pesquisa notou o crescimento de uso de recursos públicos, devido a uma preocupação com a influência do dinheiro de origem privada. O objetivo dessa iniciativa é tornar a eleição mais plural, menos desigual e melhorar a prestação de contas. Ao mesmo tempo, as doações privadas visam desonerar o dinheiro público, e incentivar as pontes entre candidatos e suas bases de apoio. Hoje, a ampla maioria dos países adota um sistema misto.

Lara Mesquita, pesquisadora do Cepesp/FGV. Foto: UmBrasil

Uma iniciativa que vem ganhando força na área é a dos Matching Funds, fundos públicos que “complementam as doações recebidas, dentro de um limite de doação, estimulando uma mobilização maior de eleitores por parte dos candidatos”, explica a pesquisadora. Por fim, Mesquita comenta que o princípio mais importante é o da transparência, e que se deve evitar a corrupção e um uso indevido de verbas, com um foco na prestação de contas.

Lara também observou que, em relação às reformas feitas, é preciso entender como elas irão funcionar ao longo das próximas eleições, já que mudanças muito grandes foram feitas e, agora, estão entrando em vigor. Para ela, mais válido que buscar novas reformas, é investir na capacidade da justiça eleitoral em fiscalizar o processo, buscando trazer mais transparência para o jogo eleitoral.

Pablo Beramendi, da Duke University, comentou que o jogo político e de campanha está mudando, algo que a pesquisa apontou. Para ele, o estudo “vai abrir muitas linhas de pesquisa futuras”, uma delas sendo a análise do impacto dos pequenos doadores e a criação de um perfil dos mesmos.

Pablo Beramendi, da Duke University. Foto: UmBrasil

O estudo “O poder do dinheiro nas campanhas eleitorais” foi coordenado pelos pesquisadores George Avelino e Ciro Biderman, e contou com as(os) pesquisadores Natalia Bueno, Lara Mesquita, Jonathan Philips, e as(os) assistentes de pesquisa, Gabriela Campos, Andreza Davidian, Arthur Fish, Thiago Fonseca, Helena Funari,  e André Jurkstas.

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